Trabalho de Roy Lichtenstein no Luna Park original
1) Por conta do eclipse solar em áries que aconteceu na virada dessa noite, começo a newsletter com um haiku mágico de Paulo Leminski:
Eu, hoje, acordei mais cedo
e, azul, tive uma ideia clara.
Só existe um segredo.
Tudo está na cara.
2) E na carona desse poema, já emendo outros dois de Manoel de Barros:
As coisas que não levam a nada
têm grande importância.
Acho que o quintal onde a gente brincou
é maior do que a cidade.
A gente só descobre isso depois de grande.
3) Vocês já ouviram falar do Luna Park? Um parque de diversões que reuniu alguns dos maiores artistas do século 20, como Basquiat, Dalí, Philip Glass, Keith Haring, David Hockney e Roy Lichtenstein. Em 1987, o artista austríaco André Heller chamou essa turma para dar vida ao projeto. Aberto em Hamburgo, na Alemanha, a empreitada teve vida curta por falta de verba. Agora, o rapper Drake resolveu investir US$ 100 milhões para trazer o parque de volta. A nova versão vai ser em Los Angeles e deve abrir no segundo semestre.
4) Estou completamente vidrada na leitura de Ioga, de Emmanuel Carrère. Para querer ler logo, vejam essa entrevista do autor. Um trecho abaixo:
Comecemos pelo começo: diferentemente do que sugere o título, Ioga não é um livro didático sobre essa atividade física tão popular no nosso tempo. Que livro é esse?
Além de uma ótima atividade física, a ioga é uma atividade mental, espiritual até: um trabalho não apenas do corpo, mas da consciência. É uma atividade que nos torna mais conscientes da própria consciência. É um pouco pedante dizer isso, mas eu pratico ioga há mais de trinta anos e, quando se reúne alguma experiência sobre algo, pode acontecer de querermos escrever sobre isso. De forma alguma como mestre — eu sou apenas um aprendiz —, mas como alguém que pratica há muito tempo e tem algo a dizer.É interessante que você tenha escolhido escrever sobre duas situações pouco propícias para a escrita: um retiro sem falar e uma longa depressão. Como funcionou isso?
Bem, a gente não escreve durante, mas depois. No retiro Vipassana era inclusive proibido escrever, você tinha que se comprometer a não fazê-lo. É interessante, contudo, que a meditação e a escrita são duas coisas com muitos pontos em comum — e outros totalmente opostos. Pelo menos no tipo de escrita que pratico, que no fundo consiste em estar muito atento aos movimentos da consciência e identificar quais são as suas correntes, ao que se engajam. Na meditação a gente deixa elas passarem, como na superfície de um rio. Na escrita a gente tenta recolher suas marcas.Eu diria que a meditação tem uma espécie de generosidade de não querer guardar nada, enquanto a escrita se propõe a tentar puxar tudo para si. Em tese, pode-se tentar escrever durante a meditação — é roubar no jogo, mas é possível. Já a depressão profunda não o permite. Os livros que foram feitos sobre o tema, como o de William Styron [Perto das trevas, Rocco, 1991], foram escritos a posteriori.
5) Outro livro que estou devorando, mas em áudio, é o da artista e autora best-seller Jenny Odell. Ela, que também escreveu "Resista: Não Faça Nada [How To Do Nothing]", lançou recentemente "Saving Time". Adorei esse trecho em que ela fala que durante a pandemia começou a conseguir enxergar o passarinho "brown creeper". Por ser muito parecido com as cores e padronagens de um tronco de árvore, vê-lo requer muita atenção. Ou como sugere Odell na publicação:
O único jeito de se deparar com um brown creeper é pousar seus olhos acidentalmente num tronco de árvore no momento exato
6) Lição de Sêneca:
É provável que alguns problemas nos aconteçam; mas não é um fato presente. Quantas vezes o inesperado aconteceu! Quantas vezes o esperado nunca aconteceu! E mesmo que seja ordenado, de que adianta correr para enfrentar seu sofrimento? Você vai sofrer em breve, quando chegar.
7) Demorou… mas foi lançado esse mês pelo FBI um aplicativo para registro de obras de arte roubadas. Se sumir aquela sua pintura do Picasso, agora você já sabe onde reclamar. Chama National Stolen Art File. Baixe aqui.
8) Essa é para a turma de São Paulo. Está em cartaz na cidade (só até 27/4!) “Pagú, Até Onde Chega a Sonda", no Teatro Eva Herz, com direção de Elias Andreato. Inspirada em um manuscrito da jornalista Patrícia Rehder Galvão, a peça é estrelada pela brilhante Martha Nowill. A atriz mistura no monólogo histórias pessoais, como sua gravidez gemelar em plena pandemia. O documento que deu origem ao espetáculo pertence a um colecionador de arte que apresentou a ideia a Nowill. Vou hoje. Quem mais anima? Ingressos aqui.
9) Mais um show deslumbrante na minha estadia paulista. Ontem foi vez de Bala Desejo no Blue Note. Naquele ambiente mais intimista, as canções que mais reverberaram foram as cantadas em espanhol. Julia Mestre é filha de mãe espanhola, e Zé Ibarra, de chilena. Quase desmaiei de emoção quando eles interpretaram o clássico Tonada de Luna Llena, de Simón Díaz, que conhecemos na voz de Caetano Veloso.
10) Depois de SP-Arte e duas exposições, uma na Galeria Lume e outra no Taller Zaragoza, me preparo para voltar pra casa. A playlist de hoje tem clima de encerramento. Vem ouvir :)
Que legal que você está gostando de Ioga! Eu tô alucinada com ele 🤓
Sempre uma lindeza ler, Gisela! Poema de Sêneca, perfeito e eu precisava ler. O livro do Yoga, já na minha lista. Bom retorno pra 🏡 😘