Cate Blanchett para W magazine
1) Sou muito fã da autora e ativista Rebecca Solnit. Estou lendo o novo livro de ensaios dela, No Straight Roads Take You There. Grifei o primeiro capítulo inteiro, que trata de celebrar a “falta de direção” com pérolas como essas:
Não tenho nada contra o fácil, o imediato, o óbvio, o direto, e o previsível. Apenas acredito que muito daquilo que queremos alcançar, e com o que nos deparamos, requer uma aceitação ou pelo menos um reconhecimento do oposto disso.
Tornei-me uma apaixonada por lentidão, paciência, resistência, e visão de longo prazo, porque essas coisas me parecem ser equipamentos cruciais para mudar ou até entender o mundo.
O futuro não é um lugar que já existe, ao qual estamos sendo arrastados, mas um lugar que estamos criando com o que fazemos e como fazemos (ou deixamos de fazer) no presente.
Saber que a gente não sabe é uma forma importante de conhecimento e até de sabedoria que nunca deveria ser substituída pela ilusão do conhecimento — mas geralmente é.
E ela cita o poeta espanhol Antonio Machado:
Caminante, no hay camino, se hace camino al andar.
Outro dia, ainda vidrada nela, resolvi andar por aí escutando um podcast antigo em que ela participou e anotei mais essas frases:
Como nos tornamos pessoas que acreditam ter o suficiente?
Citando Bill McKibben:
Quando me perguntam: “Qual a coisa mais efetiva que posso fazer como indivíduo?”, eu respondo, “Parar de ser um indivíduo. Juntar-se a outros em movimentos grandes o suficiente para fazer diferença.”Não pergunte o que vai acontecer: seja o que vai acontecer.
2) O termo Japonismo trata da fascinação que os artistas — principalmente franceses do fim do século 19 e começo do 20 — tinham pela cultura e estética japonesa. A assimetria nas composições, as cores chapadas e a planaridade da litogravura foram incorporadas nas telas impressionistas e se tornaram tema da mais nova exposição de Takashi Murakami na galeria Gagosian, em Nova York, “Japonisme —> Cognitive Revolution: Learning from Hiroshige.”
Exemplos clássicos dessa influência incluem a ponte da casa de Claude Monet em Giverny; a obsessão de Hokusai com o Monte Fuji e a de Paul Cézanne com o Monte Saint Victoire; isso sem contar as texturas marcadas, as cores fortes, o interesse na bidimensionalidade, os retratos estilizados e as árvores floridas de Van Gogh.
Essa ponte no jardim de Monet é chamada de “ponte japonesa” ou “ponte das vitórias-régias”
Mais conhecido por suas pinturas lúdicas de figurinhas com cara de flor, Murakami criou réplicas de obras de artistas japoneses e franceses em escalas variadas, colocando-as lado a lado em alguns casos:
Nesta exposição, estou me envolvendo em uma variedade artística de retrocruzamento, o processo pelo qual uma geração é formada pelo cruzamento de duas variedades diferentes e, nas gerações subsequentes, uma das variedades progenitoras é cruzada de volta com a prole. —Takashi Murakami
Montes Fuji e Saint Victoire
3) Por falar em Van Gogh… O artista observou certa vez que as pinturas misteriosas de seu conterrâneo Rembrandt eram capazes de dizer coisas que palavras não conseguiam. Ele é “mágico”, segue Van Gogh, “eu poderia encarar a pintura A Noiva Judia por 15 dias à base de um pouco de pão e água.”
Rembrandt, A Noiva Judia, 1666
4) Acabei de maratonar a série dinamarquesa Reservatet, traduzida para português como A Reserva, e em inglês como “Secrets We Keep”. Parece um mix do filme Parasita, com as séries Big Little Lies e Adolescence. As casas dos personagens são surreais! A trama me deixou grudada e curiosa do começo ao fim. Tenso…
Com delay, também estou assistindo Ripley com um dos meus filhos — adoro o Andrew Scott, aka: o padre de Flea Bag! — e, comecei a ver Your Friends and Neighbors (elenco impecável) da Apple TV+, que ainda não me pegou de vez. O que vocês estão assistindo?
5) Vocês sabiam que tem uma frase em inglês que usa todas as letras do alfabeto — um pangrama?
Quick brown fox jumps over the lazy dog.
Fiquei curiosa… e fui pesquisar um exemplo em português. A nossa versão também envolve dois bichos. Engraçado, não?
Um pequeno jabuti xereta viu dez cegonhas felizes.
6) A vida precisa ser conquistada sempre e de novo — Jung (via minha terapeuta <3)
7) Outro dia ouvi John Pizzarelli no Hotel Carlyle — experiência clássica de Nova York. Foi o jovem pianista, Isaiah J. Thompson, quem chamou minha atenção — e aí descobri que ele tem um Tiny Desk só dele:
8) Extra, extra! Já está em pré-venda Frígidas Certezas, o primeiro livro de poemas de Lucas Alberto — meu parceiro de trabalho e cúmplice nas artes.
Pedi a ele um spoiler de presente:
mindfulness
às voltas com o propósito da vida
me pego comendo salgadinhos
e limpando os dedos sujos
no alvo enxoval dos dias
em que fui todas as noivas
desde então
as horas são ímpares
os motivos estéreis
frequentar as tardes se torna algo rígido
quando o público vibrante nas linhas de chegada
me encara mudo
volto a sonhar a tristeza das crianças
nas festas dos adultos
no auge das seis
me pergunto o que falta
temendo que a resposta seja
ketchup
Corram comprar aqui e preparem-se que a fila na noite de autógrafos vai dar a volta no quarteirão :)
Também perguntei a ele: que ingredientes marcam seus poemas?
Certamente figuras de linguagem como ironia e metáfora são a farinha e a água desse livro, acredito que a apropriação e a paródia também são efeitos que terminam por produzir um humor típico ao trabalho, que revisita memórias cotidianas e ordinárias dando a elas um tempero poético e cômico.


Lucas Alberto e obra de Ana Bial que ilustra a capa
9) Eduardo Viveiros de Castro:
Ao contrário do que disse o Ministro Extraordinário de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, a Amazônia não é uma “coleção de árvores”. Estas existem nos hortos botânicos e nos jardins de palácios. A Amazônia é um ecossistema, uma floresta composta de árvores e uma infinidade de outras espécies vivas — inclusive seres humanos, que lá estão há pelo menos quinze mil anos. (…)
A floresta amazônica sempre foi povoada, e nunca foi, ou não é há muitos séculos, milênios talvez, “virgem” — a maioria das espécies úteis da floresta proliferou diferencialmente em função das técnicas indígenas de aproveitamento do território e de seus recursos.
Mary Heilmann
10) Verdade é que só estou ouvindo Beyoncé — vou ao show dela semana que vem —, mas tenho intercalado com essa playlist aqui, mais lentinha: